Título Original: Что такое искусство?
Autor: Leon Tolstói
"Todos os artistas, público e críticos, com pouquíssimas exceções, nunca experimentaram - salvo na infância e na juventude - aquele sentimento singelo, conhecido do homem mais simples e mesmo das crianças, de ser contagiado pelos sentimentos de outrem, algo que faz com que nos alegremos com a alegria do outro, soframos com seu sofrimento e misturemos nossas alma à dele, e que constitui a essência da arte."
O que é arte? Só mesmo um gênio da literatura como Leon Tolstói poderia responder a esta pergunta com um impressionante equilíbrio entre simplicidade e profundidade. Longe de ser mais uma teoria sobre estética, Tolstói vai muito além e disserta sobre a matéria-prima da arte verdadeira: o sentimento do artista. Para isso, o autor de Guerra e Paz nos leva desde as manifestações artísticas dos povos antigos até o final do século XIX, momento em que a arte se transformou em entretenimentos comerciais sem profundidade emocional - mesmo as obras esteticamente perfeitas.
No início do livro, o autor mostra como a arte da antiguidade estava ligada à necessidade do povo de transmitir sentimentos elevados, que circunstancialmente para a época, era o sentimento religioso. Ele se refere aos Salmos, Hinos Védicos, A Odisséia, etc. Porém, "a descrença das altas classes do mundo europeu no final da Idade Média criou uma situação em que a atividade artística foi substituída por uma outra cujo objetivo era proporcionar o maior prazer para um certo grupo de pessoas". A partir deste momento na História, a arte torna-se mera distração a ser consumida por uma classe nobre, ávida por pagar fortunas pelas mais supérfulas distrações. Ou seja, a arte passou de transmissão de sentimento para uma fonte de prazer.
"(...) essas pessoas não só não conseguem distinguir a arte verdadeira das falsificações, mas sempre confundem o que há de pior e mais falso com arte genuína, sem notar a genuína porque as falsificações são sempre mais chamativas, enquanto a arte verdadeira é modesta."
Diante deste cenário, Tolstói vai criticar duramente o papel dos artistas de seu tempo, colocando-os como talentosos falsificadores da arte, que sabem muito bem recortar e colar de suas referências anteriores para criar novos divertimentos vazios. Isso porque é impossível que a demanda por divertimentos consiga extrair sentimentos espontâneos da experiência de vida do artista, que segundo o autor, é o fator que faz uma arte ser verdadeira. Tolstói vai enfatizar isso durante todo o livro: que a verdadeira arte é aquela que surge da necessidade que um homem comum tem de transmitir - através de algum talento - um sentimento que tenha experimentado em sua vida, a fim de contagiar os espectadores para que estes sintam a mesma experiência vivida pelo artista. "As palavras são a comunicação de conhecimento, enquanto a arte é a comunicação de sentimentos", diz o escritor.
Sendo assim, o gênio da literatura russa condena a produção comercial em série da arte, pois isso prejudica a sensibilidade artística do público, que acaba ficando acostumado com uma arte falsa. Apesar de ter sido escrito a mais de cem anos atrás, esta obra nunca foi tão atual diante da imensa quantidade de lixo artístico que infestam a TV, os palcos e os cinemas dos dias de hoje. Arte artificial, fabricada com o único intuito de dar lucro.
"Quando a arte se tornou uma profissão, sua maior e mais preciosa propriedade - a sinceridade - tornou-se enfraquecida e foi parcialmente destruída."
Seguindo esta linha, Tolstói vai exaltar alguns contos e quadros de camponeses desconhecidos, enquanto critica algumas obras de famosos - como Beethoven e Goethe - como sendo artificiais. Ele chega a criticar até mesmo suas próprias obras. Para ele, a arte tem um papel muito mais elevado do que dar prazer a uma elite entediada: a arte é o caminho para a unificação e paz entre os povos. Assim, este livro resgata a essência do ser humano, aquelas sensações sinceras e experiências intensas que somente as crianças e os cidadãos comuns experimentam... sensações essas que são a verdadeira matéria-prima da arte que toca o público e coloca a Humanidade em um caminho de unidade através desta comunicação de sentimentos.
Em resumo, O que é arte? não é um livro que serve para alimentar o ego de intelectuais com teorias bonitas, para que impressionem em textos, críticas e aulas. A obra de Tolstói é uma riquíssima - porém incômoda - reflexão sobre o papel da arte como catalisador do bem comum entre os homens, através da comunicação por sentimentos. E infelizmente, esta necessidade de comunicar sentimentos vem sendo substituída com entretenimentos vazios, gerando assim uma sociedade fria, robótica, depressiva e carente emocionalmente.
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E você, o que pensa sobre esta polêmica visão de Tolstói? Concorda? Discorda? Deixe o seu comentário!
quarta-feira, 28 de setembro de 2016
segunda-feira, 8 de agosto de 2016
O Senhor das Moscas
Título Original: Lord of the Flies
Autor: William Golding
O que aconteceria se um bando de crianças fossem largadas em uma ilha deserta? Como sobreviveriam e como se organizariam em sociedade? Em O Senhor das Moscas, o ganhador do prêmio Nobel Willian Golding responde a estas perguntas através de uma história que desnuda a natureza humana no contexto dos relacionamentos pessoais e construções sociais. Não há nada mais cativante do que trabalhar com as emoções infantis. O autor soube usar com maestria esses elementos para mostrar como o ser humano rompe com facilidade os limites entre a civilidade e selvageria, entre a inocência e a violência, entre a democracia e a autocracia.
“- Acho que precisamos de um chefe para resolver as coisas.
- Um chefe! Um chefe!
- Eu é que devo ser o chefe - disse Jack com uma arrogância simples - porque sou chefe do coro, além de solista. E consigo atingir o dó sustenido.”
A sinopse é curiosa: um avião cheio de crianças cai em uma ilha deserta e os únicos adultos presentes no voô (os pilotos) morrem na queda. Assim, um bando de crianças inglesas, entre seis e treze anos de idade, devem se virar para sobreviver e ao mesmo tempo tentar chamar a atenção para serem resgatados por algum navio. No início tudo é festa e brincadeira. Eles encontram frutas para comer. Porém a necessidade de ordem e de caçar os leva a viver momentos de tensão e desavenças, numa disputa intensa por poder.
“- Tem coisas que os adultos sabem. - disse Porquinho - Eles não sentem medo do escuro. Eles se encontram, tomam chá e conversam. E aí os problemas se acabavam.”
O autor se mostra extremamente competente ao construir personagens infantis muito convincentes, através de diálogos que surpreendem pela inocência, pureza e espontaneidade. Ao longo da trama, o caráter de cada pequenino é revelado aos poucos, conforme as circunstâncias vão ficando extremas e difíceis. Essa evolução - ou involução - lenta e gradual de alguns personagens é um fator decisivo que faz de O Senhor das Moscas uma obra-prima.
“- E eu, não ganho nada?
Tinha sido mesmo intenção de Jack deixá-lo na dúvida, para reafirmar o seu poder; mas Porquinho, ao anunciar ter sido preterido, tornou necessária a crueldade adicional.
- Você não caçou.”
Além disso, o livro levanta, de forma indireta, diversas questões filosóficas e sociológicas interessantes. O que somos de fato? Somos produtos do meio, ou o meio é um produto nosso? Qual é o modelo ideal de organização política? Um modelo inclusivo que prioriza a vida e a diversidade vocacional, mesmo que isso acarrete mais lentidão no desenvolvimento tecnológico? Ou um modelo exclusivista, cuja prioridade está nas conquistas materiais através da meritocracia e padronização do ser humano? O que funciona melhor: o diálogo ou a imposição autoritária? Como os mitos, crenças e fanatismos são originados? Enfim, a história trata sutilmente dessas e de outras questões, nas entrelinhas dos conflitos entre os personagens.
“Eu tenho medo dele - disse Porquinho - e é por isso que eu sei quem ele é. Quando você sente medo de alguém, odeia a pessoa mas não consegue parar de pensar nela. Você se engana, diz que no fundo ele é bom, mas então, da próxima vez que encontra a pessoa, parece que tem uma crise de asma, e não consegue respirar. E vou dizer mais uma coisa. Ele detesta você também, Ralph."
Enfim, O Senhor das Moscas é leitura obrigatória para aqueles que não se contentam com meras ficções escapistas. É uma obra cativante, visceral, tensa e rica em reflexões importantes sobre a natureza do ser humano e seu papel nas relações sociais. Além disso, a obra serviu de inspiração para vários sucessos comerciais na literatura e no cinema, dentre eles Battle Royale (Koushun Takami, Japão, 1999) e Jogos Vorazes (Suzanne Collins, EUA, 2008).
Puxou a faca da bainha e a cravou no tronco de uma árvore. Da próxima vez não teria piedade. Olhou em volta com ar feroz, desafiando os outros a duvidar do que dizia.
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E você, já leu? Conte nos comentários o que achou da leitura!
Autor: William Golding
O que aconteceria se um bando de crianças fossem largadas em uma ilha deserta? Como sobreviveriam e como se organizariam em sociedade? Em O Senhor das Moscas, o ganhador do prêmio Nobel Willian Golding responde a estas perguntas através de uma história que desnuda a natureza humana no contexto dos relacionamentos pessoais e construções sociais. Não há nada mais cativante do que trabalhar com as emoções infantis. O autor soube usar com maestria esses elementos para mostrar como o ser humano rompe com facilidade os limites entre a civilidade e selvageria, entre a inocência e a violência, entre a democracia e a autocracia.
“- Acho que precisamos de um chefe para resolver as coisas.
- Um chefe! Um chefe!
- Eu é que devo ser o chefe - disse Jack com uma arrogância simples - porque sou chefe do coro, além de solista. E consigo atingir o dó sustenido.”
A sinopse é curiosa: um avião cheio de crianças cai em uma ilha deserta e os únicos adultos presentes no voô (os pilotos) morrem na queda. Assim, um bando de crianças inglesas, entre seis e treze anos de idade, devem se virar para sobreviver e ao mesmo tempo tentar chamar a atenção para serem resgatados por algum navio. No início tudo é festa e brincadeira. Eles encontram frutas para comer. Porém a necessidade de ordem e de caçar os leva a viver momentos de tensão e desavenças, numa disputa intensa por poder.
“- Tem coisas que os adultos sabem. - disse Porquinho - Eles não sentem medo do escuro. Eles se encontram, tomam chá e conversam. E aí os problemas se acabavam.”
O autor se mostra extremamente competente ao construir personagens infantis muito convincentes, através de diálogos que surpreendem pela inocência, pureza e espontaneidade. Ao longo da trama, o caráter de cada pequenino é revelado aos poucos, conforme as circunstâncias vão ficando extremas e difíceis. Essa evolução - ou involução - lenta e gradual de alguns personagens é um fator decisivo que faz de O Senhor das Moscas uma obra-prima.
“- E eu, não ganho nada?
Tinha sido mesmo intenção de Jack deixá-lo na dúvida, para reafirmar o seu poder; mas Porquinho, ao anunciar ter sido preterido, tornou necessária a crueldade adicional.
- Você não caçou.”
Além disso, o livro levanta, de forma indireta, diversas questões filosóficas e sociológicas interessantes. O que somos de fato? Somos produtos do meio, ou o meio é um produto nosso? Qual é o modelo ideal de organização política? Um modelo inclusivo que prioriza a vida e a diversidade vocacional, mesmo que isso acarrete mais lentidão no desenvolvimento tecnológico? Ou um modelo exclusivista, cuja prioridade está nas conquistas materiais através da meritocracia e padronização do ser humano? O que funciona melhor: o diálogo ou a imposição autoritária? Como os mitos, crenças e fanatismos são originados? Enfim, a história trata sutilmente dessas e de outras questões, nas entrelinhas dos conflitos entre os personagens.
“Eu tenho medo dele - disse Porquinho - e é por isso que eu sei quem ele é. Quando você sente medo de alguém, odeia a pessoa mas não consegue parar de pensar nela. Você se engana, diz que no fundo ele é bom, mas então, da próxima vez que encontra a pessoa, parece que tem uma crise de asma, e não consegue respirar. E vou dizer mais uma coisa. Ele detesta você também, Ralph."
Enfim, O Senhor das Moscas é leitura obrigatória para aqueles que não se contentam com meras ficções escapistas. É uma obra cativante, visceral, tensa e rica em reflexões importantes sobre a natureza do ser humano e seu papel nas relações sociais. Além disso, a obra serviu de inspiração para vários sucessos comerciais na literatura e no cinema, dentre eles Battle Royale (Koushun Takami, Japão, 1999) e Jogos Vorazes (Suzanne Collins, EUA, 2008).
Puxou a faca da bainha e a cravou no tronco de uma árvore. Da próxima vez não teria piedade. Olhou em volta com ar feroz, desafiando os outros a duvidar do que dizia.
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